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O papel da história no processo de pesquisa.

A história é fundamental para podermos aprender os processos, ações e sequências de desenvolvimento a partir de uma perspectiva histórica da sociedade em movimento constante e em constante fluxo. Assim a pesquisa precisa conseguir focalizar a sequência de eventos em gente, tempo e lugar. É preciso integrar a história e dados documentais a análise antropológica de processos sociais para poder detectar esse movimento das sociedades.
A perspectiva histórica é importante também para não se limitar o estudo apenas a um pedaço da ação. Como diz Victor Turner é preciso interpretar as mudanças sociais que abalam a base e os alicerces da ordem social. Pois na prática histórica, a luta de classes não se conforma às regras comumente aceitas.
Antropólogos sempre que possível se basearam em documentação histórica para reconstrução da sociedade, mas os dados históricos foram usados como pano de fundo, ao invés de serem tratados como parte integral da análise antropológica. Existe uma necessidade clara de se utilizar os dados históricos como parte constituinte da análise de processos sociais a partir da perspectiva antropológica que focaliza o estudo dos espaços intersticiais. Enfatizar a análise de indivíduos em movimento através do tempo e espaço, usando farto material histórico permite à Antropologia diferenciar os limites da observação dos limites da investigação.
Ao estudar o interstícios sociais a partir de um enfoque que integra a história e dados documentais a análise de processos sociais, a análise antropológica fica mais próxima do dia a dia das pessoas, e ao mesmo tempo abre perspectiva para estudos que pretendam trazer a tona complexidades sociais.

Bibliografia :

A favor da Etnografia – Mariza Peirano – Editora Relume Dumará

Antropologia das Sociedades Contemporâneas – Métodos
Introdução e Organização Bela Feldman-Bianco

S.F Nadel/J.Clyde Mitchell/Adrian C.Mayer/ J.A Barnes / Jeremy Boisevain/Max Gluckman/J.Van Velsen/ Joan Vincent

Pesquisa Etnográfica – Secretaria da Educação do Estado de São Paulo

O novo olhar e nova pergunta que mudaram a pesquisa etnográfica.

Uma nova estratégia do pesquisador surgiu com a mudança do olhar, ou melhor da pergunta básica do que quer se descobrir. Ao invés de como a sociedade se mantém para “Como a sociedade se transforma?” Esta última, tem como objetivo captar a complexidade, a variação do fluxo social através do estudo dos espaços intersticiais, e tem forte influência de Marx e Weber.
Vejamos então as diferentes estratégias dos pesquisadores e seus diferentes olhares.
Se Malinowski privilegiou a análise de indivíduos em detrimento de sistemas e Radcliffe-Brown tendeu a abstrair os indivíduos em favor de análises sistêmicas, os pesquisadores que aderiram a esse novo método oriundo da “teoria da ação” tentam integrar ambos na análise: indivíduos e estrutura social.
Mas essa corrente de pesquisadores também trouxe riscos metodológicos, pois eles se recusaram a considerar os estudos das outras disciplinas, preocupados em proteger suas identidades profissionais. Assim, colocaram limites artificiais a suas investigações.
Eles não incluíram em sua análise por exemplo, perspectivas da economia política.
Várias outras estratégias foram sendo colocadas em prática sempre partindo do objetivo de cada pesquisador. Barnes e Mayer enfatizavam o estudo da morfologia das relações interpessoais, Boissevain adota a “teoria dos jogos” para privilegiar a análise do conflito e da competição. Mas em todas essas visões percebemos que elas muitas vezes são evoluções ou tem forte influência de outras teorias consideradas precursoras da Antropologia como Levis Strauss, Malinowski, Bath, Gluckma, Radcliffe- Brown, Firth, entre outros. A própria teoria da ação teve inúmeros desdobramentos em estratégias de pesquisa por diferentes correntes da Antropologia contemporânea. Worsley foi um deles, que defendia a idéia de privilegiar o estudo microscópico de relações e situações sociais a partir de uma perspectiva que inclui uma visão da economia política mais ampla e a integração da história na análise antropológica. Van Velsen defendia uma análise sequencial de situações sociais e focaliza gente, lugar e tempo como objetivo de apreender processos, ações e sequências de desenvolvimento em contextos específicos através da perspectiva da sociedade em movimento e em constante fluxo. Seu preceito de pesquisa de campo tenta evitar as generalizações sobre regularidades estruturais. Ele tenta, ao observar pessoas através de um período adequado de mudanças sociais, detectar padrões em suas relações, suas ideias e suas instituições. Mas Van Velsem baseou-se numa dimensão limitada de tempo, não tendo se interessado em relacionar a Antropologia com a História. Já Vincent propõe uma alternativa metodológica processual que combina dados antropológicos e material histórico. Ele busca em suas estratégias pesquisar os homens em movimentos e ações, e empreendimentos que são dependentes para o sucesso de operações, atravessando o espaço e consideráveis períodos de tempo.
Ao resgatar a contribuição microscópica da Antropologia para a realização de investigações e interpretações mais amplas sobre processo de desenvolvimento passados e presentes, segundo Bela Feldman, Vicent ajudou a retirar as amarras de métodos de pesquisa anteriores. Mas o que podemos concluir é que a estratégia do pesquisador e seu olhar do sujeito da observação é fundamental para o resultado que se quer chegar com a investigação. E ir a campo para observar e inspecionar os acontecimentos parece fundamental em qualquer estratégia de investigação

O olhar do pesquisador e as mudanças de suas estratégias de investigação .

A Antropologia desenvolveu diferentes métodos de análise dentro do contexto histórico. Tivemos o enfoque funcionalista-estrutural, com ênfase na construção de modelos e na análise de sistemas sociais em equilíbrio. Esses pesquisadores como Malinowski e Radcliffe-Brown contribuíram para a formulação da teoria da ação que privilegia a observação e reconstrução do comportamento concreto de indivíduos específicos em situações estruturadas. Esse olhar do pesquisador foi gerando algumas vertentes da teoria da ação que começaram a diferenciar os limites das observação dos limites da investigação e essa diferenciação possibilitou a elaboração de instrumentais capazes de integrar a história e dados documentais a análise antropológica de processos sociais.
Um outro olhar de pesquisa é o que, ao invés de enfatizar a observação do comportamento concreto, apoia-se em indagações verbais que têm como objetivo reconstruir visões do mundo. Segundo Bela Feldman, esse dois procedimentos são complementares da pesquisa de campo. Mas essas duas estratégias levam também a dois paradigmas da teoria antropológica. Um que leva a um enfoque cultural (símbolos e significados) e um outro ao enfoque utilitarista (prática).
Quando estamos operacionalizando as pesquisas, essas opções resultam em tratamentos diferentes aos sujeitos da investigação. Eles podem ser tratados como atores sociais ou como informantes. Isso traz distinções radicais, podendo ser éticas (interpretações do pesquisador) ou êmicas ( interpretação do informante). Quando se adota privilegiar os relatos de informantes porém , corre-se o risco de o pesquisador adotar categorias e conceitos sem problematizar e analisar como, quando, por que e em que circunstâncias históricas estas categorias e conceitos emergiram.
Da fase evolucionista e funcionalista-estrutual da antropologia, começou-se a criticar a verdadeira função e poder de contribuição da antropologia. O olhar do pesquisador e suas estratégias nessas correntes teóricas foi duramente contestada por ter uma visão “ocidental” e superior dos povos pesquisados, de não ser capaz de imunizar a visão do pesquisador do objeto pesquisado, de limitar a pesquisa as sociedades exóticas e marginais ao mundo ocidental, partir de pressupostos de sociedades que vivem em equilíbrio sem considerar o contexto histórico, entre outras críticas. Outro questionamento sobre os métodos até então aplicados de pesquisa era o fato de não serem abrangentes o suficiente para explicar os movimentos de sociedades mais complexas. Isso levou à uma dúvida sobre a capacidade da antropologia e seus métodos de pesquisa. Mas foi justamente o surgimento de novas problemáticas e novas questões durante processos de trabalho de campo na década de 50/70 em situações de rápida mudança social como as migrações por exemplo, que implicaram em reformulações e refinamento de antigos pressupostos teóricos e procedimentos de pesquisa, resgatando a identidade da Antropologia. Uma das primeiras consequências foi a proposta de o pesquisador focar no estudo microscópico e detalhado dos interstícios sociais e relações interpessoais. Mas é inegável que apesar das crítcas feitas aos evolucionistas, culturalistas, funcionalistas, estruturalistas, interpretalistas, etc, alguns dos seus métodos de pesquisa foram os grandes influenciadores da “renovação” da antropologia praticada hoje.

Como fazer uma pesquisa etnográfica.

Primeiro precisamos de uma teoria que será a base do objeto/sujeito que queremos investigar. É partir dessa teoria que a pesquisa é montada.
A Pesquisa Etnográfica exige constante reflexão e reestruturação do processo de questionamento do pesquisador.
O objetivo é revelar o significado cotidiano no qual as pessoas agem e encontrar o significado das suas ações. Já o objeto da etnografia é o conjunto de significados onde os eventos, fatos, ações e contextos são produzidos, percebidos e interpretados.
O pesquisador deve entender e validar o significado das ações de forma que este seja o mais representativo possível do significado que as próprias pessoas pesquisadas dariam à mesma ação, evento ou situação interpretada.
A preocupação da etnografia é obter uma descrição densa, a mais completa possível, sobre o que um grupo particular de pessoas faz e o significado das perspectivas imediatas que eles têm do que eles fazem
A qualidade da pesquisa depende das qualidades de observação, de sensibilidade ao outro, do conhecimento sobre o contexto estudado, da inteligência e da imaginação científica do etnógrafo. É preciso se preparar antes de sair a campo. Tradicionalmente fazemos comparações entre a nossa própria cultura e a de outros povos, ou na forma mais contemporânea e urbana, do conhecimento do antropólogo com as idiossincrasias do grupo estudado, que podem ser jovens, mulheres, donas de casa, etc.
O interesse comparativo na etnografia é aliado ao interesse na descrição holística da cena, do evento social e da interação grupal que nos propomos investigar.
Ao estudar uma sociedade, o etnógrafo tenta estudar o todo dessa sociedade, os fatos sociais que ocorrem nesse contexto.
Preocupação com o interesse dos atores sociais na escolha de uma determinada forma de comportamento e qual o significado dessa escolha.
Enfatiza-se o significado da interação como um todo: a relação entre a cena imediata da interação social de um grupo + o significado do fato social ocorrido em grandes contextos.
O processo deve seguir algumas orientações didáticas, exemplificando:
Microanálise etnográfica: 1º) obsevação, 2º) particularização de um fato microanaliticamente relevante, que represente o todo do processo estudado .
O pesquisador deve partir do contexto maior, olhando a comunidade ou grupo como um todo até poder destacar uma particularidade generalizável desse contexto que possa ser estudada microanaliticamente. Nos na Traje Social chamamos de determinantes fundamentais.
A pesquisa etnográfica visa a compreensão da cultura de um grupo de pessoas com o objetivo de entender os motivos de determinado tipo de comportamento. Envolve a imersão, a convivência, a observação e a entrevista como métodos e intrumentos de pesquisa. O papel do cientista / investigador na pesquisa etnográfica é de intérprete da realidade que ele está observando, ou seja, de dados empíricos, retirados de contextos reais .
Observação participante;
Entrevistas intensivas;
Perspectiva teórica (enfoque);

As vantagens da Etnografia feita por antropólogos no estudo de comportamento.

Na Antropologia as orientações teóricas estão relacionadas a especificidades geográficas de uma maneira que talvez não aconteça em outras ciências sociais. A teoria antropológica sempre se fez melhor quando atrelou a observação etnográfica ao universal/teórico.
A obra de um antropólogo não se desenvolve linearmente, ela revela nuances etnográficas-teóricas que são “energizadas” pela experiência do campo.
O texto etnográfico une a ambição universalista da disciplina com os dados novos detectados pelo pesquisador em determinado contexto etnográfico. Existe um vínculo entre a pesquisa e a teoria na antropologia. Evans Pritchard em seu método, demonstrou como a pesquisa etnográfica é o meio pela qual a teoria antropológica se desenvolve e se sofistica quando desafia conceitos estabelecidos pelo senso comum no confronto entre a teoria que o pesquisador leva para campo e a observação entre o que estuda. E pensar dessa maneira é pensar comparativamente, é contrapor o confronto/impacto entre a bagagem da cultura do pesquisador com o que está observando.
A pesquisa de campo traz para o material etnográfico mais riqueza. Quando não se tem a pesquisa de campo o diálogo ocorre apenas entre teorias, a do antropólogo e as teorias dos grupos estudados por exemplo, e faz desaparecer o diálogo que acontece dentro do antropólogo. O risco aqui é se manter ainda a diferença entre “nós” e “eles”.
Outra vantagem da etnografia é que dados etnográficos antropológicos geralmente permitem uma reanálise, onde é possivel encontrar um resíduo inexplicado nos dados iniciais e gerar uma nova configuração interpretativa. Assim, Mariza Peirano defende que “toda boa etnografia precisa ser tão rica que possa sustentar uma reanálise dos dados iniciais. Dados que falarão mais que o autor e permitirão uma abordagem diversa.” E justamente essa reanálise de um corpo etnográfico é a prova da adequação e qualidade da etnografia.
A etnografia então, é um campo fértil e inspirador da teoria do trabalho do antropólogo. Mariza Peiron conclui a defesa da etnografia assim: “ A prática da etnografia – artesanal, microscópica e detalhista – traduz como poucas outras, o reconhecimento do aspecto temporal das explicações. Longe de representar a fraqueza da antropologia, portanto, a etnografia dramatiza, com especial ênfase, a visão weberiana da eterna juventude das ciências sociais”.

Etnografia de verdade é feita por Cientistas Sociais

Existem muitos institutos de pesquisa do comportamento que dizem utilizar a Etnografia como método de pesquisa. Mas na prática, sabemos que em sua grande maioria, não usam realmente a Etnografia como manda a ciência. No Traje Social, todos os estudos são feitos por cientistas sociais com no mínimo mestrado que realizam a pesquisa de campo. Por essa razão, resolvemos publicar os textos abaixo extraídos de vários autores que explicam e contextualizam a Etnografia como método para que, principalmente os clientes/empresas que o desejem usar, tenham uma noção básica de todo processo envolvido.

Zuza Tupinambá
Sócio/Diretor Traje Social

Bibliografia :
A favor da Etnografia – Mariza Peirano – Editora Relume Dumará

Antropologia das Sociedades Contemporâneas – Métodos
Introdução e Organização Bela Feldman-Bianco

S.F Nadel/J.Clyde Mitchell/Adrian C.Mayer/ J.A Barnes / Jeremy Boisevain/Max Gluckman/J.Van Velsen/ Joan Vincent

Pesquisa Etnográfica – Secretaria da Educação do Estado de São Paulo